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Alvaro Valle
Alvaro Bastos Valle

Patrono
REVOLUÇÃO NO VATICANO
   
O Papa Francisco constituiu uma comissão de cardeais, representantes dos cinco continentes, para assessorá-lo na administração da Igreja e estudar um projeto de revisão da "Constituição Apostólica Pastor Bonus", que rege a Cúria Romana participando diretamente na reforma do Pontificado. Segundo o Secretário Adjunto da Secretaria de Estado, Dom Angelo Becciu, em entrevista ao jornal da Santa Sé, "L'Osservatore Romano", o Papa está impondo um estilo de vida de "essencialidade evangélica" no Vaticano e está decidido a cumprir uma verdadeira reforma da Cúria Romana.

No grupo nomeado, destacam-se os nomes de dois cardeais de origem latino-americana: o Arcebispo emérito de Santiago do Chile, Cardeal Francisco Javier Errazuriz Ossa, e o Cardeal Arcebispo de Tegucigalpa (Honduras), Cardeal Oscar Andrés Rodríguez Maradiaga, que exercerá o cargo de coordenador.

As origens da Cúria datam dos últimos séculos do primeiro milênio, quando um pequeno número de pessoas ajudava o bispo de Roma na gestão das atividades de administração e de redação dos documentos. Na segunda metade do século XI e no século XII, com a reforma promovida pelo Papa Gregório VII, ocorreu uma transferência do poder aos cardeais. Seguiu-se daí o fortalecimento dos membros da Cúria e de suas funções, em contínua expansão, com o mesmo fortalecimento da atividade financeira e a incorporação das instâncias jurídicas de apelação.

Hoje, a Cúria Romana deve ser vista a partir de outras perspectiva e sua reforma deve ser vista sob o ponto de vista da economia empresarial. A análise é de André Zund, publicada na revista alemã Stimmen der Zeit e publicada no blog da Editora Queriniana. Segundo o analista, a Igreja pode aprender muito com especialistas em managemen, gestão em todas as atividades empresariais e organizacionais, de forma a coordenar os esforços das pessoas para atingir os objetivos desejados. Ele destaca que a Igreja não é uma empresa, embora alguns já tenham falado até de uma "empresa de serviços pastorais". A Igreja não é uma multinacional. No entanto, existem paralelismos entre a Igreja Católica universal e um holding mundial. Poder-se-ia, por exemplo, compará-la a um grupo empresarial mundial, classificando-a com o um conjunto de Igrejas locais e particulares que formam uma única comunidade eclesial sob uma direção unitária. Seja para grupos empresariais, seja para a Igreja, onde vigora o mesmo princípio da unidade na pluralidade.

Entre Igreja universal e grupos empresariais mundiais, há, portanto, as seguintes características comuns: são ambos os sistemas que operam em ambientes diferentes, que têm uma direção unitária e apresentam uma estrutura hierárquica, devendo encontrar um caminho do meio entre centralização e descentralização dos processos decisórios e lutar contra a burocracia. As diferenças estão, sobretudo, no fato de que a Igreja não é apenas uma organização social. Conforme seus cânones, ela é de origem divina e tem um mandato divino. Para Zund, a Cúria Romana é comparável a um complexo edifício antigo, ao qual, ao longo do tempo, foram acrescentadas construções dos mais diversos estilos arquitetônicos e cujas fachadas foram, de épocas em épocas, novamente pintadas, sem serem submetidas a uma renovação abrangente.

Nem o Concílio Vaticano II pôde fazer uma reforma da Cúria, porque o papa a reservou a si, como questão de sua competência específica. Nos anos 1967 e 1968, Paulo VI, ele mesmo um homem da Cúria, deu início a uma reforma do órgão. Ela incluiu uma grande quantidade de novas denominações, de definições de competências, de fusões e repartições, mas nenhuma reforma estrutural. Nem mesmo o Papa João Paulo II conseguiu fazer uma verdadeira reforma da Cúria. Teve mais sucesso os seus esforços para as finanças do Vaticano, esforços que, após os conhecidos escândalos, levaram a decisões em torno de um melhor controle da gestão financeira e a um maior controle dos balanços.

Hoje a Cúria Romana é formada pela Secretaria de Estado, nove Congregações, 11 Conselhos, três Tribunais, além de outros secretariados e escritórios. As mini reformas realizadas não introduziram nenhuma mudança de paradigma, mas mantiveram a marca medieval da Igreja até então conhecida, além de terem reforçado - no máximo e de modo sutil - a orientação centralista da Cúria como instrumento de poder de um papado monárquico. Que forma ela deve assumir no futuro depende essencialmente da idéia de governo da Igreja, ou seja, do modelo de Igreja. E dois modelos estão frente a frente.

De um lado, o modelo ancorado no autoritarismo romano-católico, que compreende a Igreja de modo hierárquico, centralista e uniforme. E, de outro, o modelo ancorado no paradigma pós-moderno contemporâneo e ecumênico, que se ancora em uma idéia colegial de Igreja. Depois do Concílio, o cardeal León-JosephSuenens definiu em uma entrevista os dois modelos de Igreja segundo o ângulo visual de centro e sua periferia. Na Igreja, as tensões entre o "centro" - Roma - e a "periferia" - o restante da Igreja universal - surgem da tensão entre as duas vertentes diferentes a se considerar: uma que parte do "centro" que vai rumo à "periferia", a ele subordinada. A outra, que parte das Igrejas periféricas autônomas, ligadas à Igreja de Roma como centro da unidade entre todas elas.

Os representantes da Igreja não se cansarão de repetir que a Igreja não é uma democracia moderna e que, por isso, não é obrigada a seguir nenhum princípio do estado de direito, como se fosse um mérito poder renunciar ainda hoje às conquistas da Revolução Francesa. A questão é apenas esta: e uma instituição universal desse tipo, com a sua elevada pretensão moral, no início do terceiro milênio, é respeitada o bastante para encontrar o respeito do mundo, como mereceria.

Uma idéia filosófica-política fundamental que está na base de todas as constituições modernas, infelizmente ainda penetrou pouco na Igreja Católica. Trata-se da doutrina da separação dos poderes, que remonta a Montesquieu, para impedir abusos de poder e é justamente a aceitação de princípio provados pelos estados de direito, como a divisão dos poderes em Executivo, Legislativo e Judiciário.



   
 
 
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