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Alvaro Valle
Alvaro Bastos Valle

Patrono
A EUROPA DE IMIGRANTES
   
A Europa vive hoje um dilema com seus imigrantes ilegais. Enquanto o primeiro-ministro britânico, David Cameron, propõe um maior controle da imigração como prioridade legislativa do seu governo, anunciado em um discurso sobre o programa do executivo lido pela Rainha Elizabeth II no parlamento, o Papa Francisco homenageou os imigrantes africanos que tentam chegar à Europa, desembarcando na ilha de Lampedusa, no Sul da Itália, cercados por dificuldades, pois a maioria chega clandestinamente em barcos lotados e precários, quando muitos morrem no caminho e vários são impedidos de permanecer na Europa.

A dificuldade na assimilação de imigrantes costuma ser atribuída à falta de planejamento dos governos europeus, em outros temas tão eficientes em aplicar políticas com uma visão de longo prazo. Enquanto nos Estados Unidos se criaram diretrizes para receber novos cidadãos desde a Independência, em 1776, isso só foi feito recentemente na Europa. Segundo o consultor grego Demetrios Papademetriou, presidente do Instituto de Políticas de Migração, em Washington, nos Estados Unidos, os requisitos mínimos para alguém obter o status de americano são aceitar as normas da sociedade e estar disposto a trabalhar, enquanto que os europeus sempre pediram mais que isso. Exigem o respeito à tradição, à cultura e ao idioma.

A verdade é que a Europa não pretendia ser um destino natural de imigrantes. Pensava-se que os três principais fenômenos migratórios do século XX na região seriam temporários e que logo os estrangeiros voltariam para sua terra natal. Nos anos 50 e 60, cidadãos dos países do sul da Europa mudaram-se para os do norte para trabalhar na reconstrução após a II Guerra Mundial. Depois, nações comprometidas com os direitos humanos, como a Inglaterra, a Alemanha e os países escandinavos, passaram a conceder asilo a refugiados de guerra e perseguidos políticos vindos principalmente do Oriente Médio e da Ásia. Com a independência das ex-colônias européias na África e na Ásia, nos anos 60 e 70, o fluxo de pessoas alcançou seu auge. Ainda assim, as políticas migratórias só entraram em vigor nos últimos quinze anos.

Para os analistas internacionais as medidas restritivas aos imigrantes tem reflexos diretos na economia dos países de onde são banidos, sem falar no fortalecimento da xenofobia ( medo irracional, aversão ou profunda antipatia em relação aos estrangeiros) e da direita, como partidos neo-nazistas. Pesquisa publicada pelo jornal "Financial Times" mostra que mais da metade dos italianos e dos britânicos e a maioria dos cidadãos da França, da Alemanha, da Espanha e dos Estados Unidos apoiariam que os governos pedissem que os imigrantes deixassem o país. Nesses países, a taxa de desemprego sofreu um grande aumento com a crise econômica. No Reino Unido, por exemplo, o desemprego atingiu os números mais altos em uma década. Entre exemplos de medidas recentes contra imigrantes, o Senado italiano aprovou recentemente um projeto que permite aos médicos denunciar os imigrantes à polícia. França e Espanha incentivaram, por meio de leis, o retorno voluntário de imigrantes. O governo espanhol propôs ainda uma reforma na lei de imigração, ainda por ser votada, que prevê multa para quem der ajuda a imigrantes ilegais.

O jornal francês Le Figaro, em recente artigo, destacou que os adeptos da xenofobia condenam os imigrantes pela falta de trabalho, entretanto esquecem que esse processo foi desencadeado pelos seus líderes, que permitiram a entrada desses trabalhadores para executar tarefas que os nacionais se recusavam a desenvolver. Pelo artigo "esse processo é resultado do imperialismo ocorrido no passado, quando as metrópoles tinham como objetivo exclusivo explorar a colônia e nunca de permitir medidas para que essa estabelecesse mecanismos para seu desenvolvimento".

Mas a verdade é que os movimentos xenófobos vêm crescendo gradativamente, especialmente a partir dos anos 80 com as crises econômicas que ocorreram nessa década e nos anos 90, com o aumento do desemprego em escala global. Segundo os líderes e adeptos desse tipo de movimento, essa aversão aos imigrantes não se deve a preconceitos por origem, e sim pela preocupação com a perda de identidade cultural, a competitividade entre um nacional e um imigrante, pois o último se sujeita a menores salários e condições precárias de trabalho, isso força uma deflação geral. Além disso, a entrada da religião mulçumana na Europa é vista como uma ameaça, principalmente após os ocorridos em 11 de setembro nos EUA.

Devido às pressões de grupos xenófobos, o governo francês implantou medidas de restrição aos imigrantes. Nesse caso, os mais afetados foram os africanos e mulçumanos (ex-colônias). Essa realidade não se resume somente à França, pois os outros países europeus desenvolvidos estabeleceram leis extremamente rigorosas para impedir a entrada de imigrantes. Recentemente, o grupo de imigrantes que mais sofrem com a discriminação são os do leste europeu. Assim, os países da Europa Ocidental impuseram a cobrança de vistos, mas para adquiri-los as burocracias são tão grandes que se torna uma tarefa difícil de alcançar. Esse tipo de discriminação por parte da população da Europa, especialmente da parte ocidental, tem proporcionado o crescimento e a atuação de grupos denominados de neonazistas, com atentados violentos, principalmente na Alemanha com uma grande incidência de agressões a imigrantes.

Segundo a agência oficial de estatísticas da União Européia, Eurostat, até 2061 pouco mais de um quarto de seus habitantes será imigrante ou descendente de estrangeiros. Na Áustria, a proporção poderá chegar a 40%. Do ponto de vista econômico, a mudança é necessária. A chegada dos imigrantes impede que a população desses países diminua. As mulheres européias estão tendo poucos filhos, uma tendência que já vem de décadas. Por causa disso, a região precisará receber 700 milhões de pessoas até 2050 apenas para manter o atual nível populacional. O desafio será assimilar esse contingente de origens culturais e religiosas variadas sem prejuízo para os traços de identidade marcantes da Europa, como o secularismo, o respeito às minorias e a liberdade de expressão. Trata-se de um dilema que nenhum país europeu conseguiu, até o momento, solucionar plenamente.



   
 
 
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